sábado, 5 de abril de 2008

Seringueiro contesta lei de privatização das florestas e promete resistir, em homenagem aos "20 anos sem Chico Mendes"

Fonte: Agência Petroleira de Notícias (http://www.apn. org.br)

Depois de mais de 30 anos de lutas, os Povos da Floresta enfrentam um
dos momentos mais difíceis, na defesa da Amazônia e da viabilidade
econômica da produção extrativista, praticada há séculos na região.
Osmarino Amâncio Rodrigues, presidente da Associação de Moradores e
Produtores da Reserva Chico Mendes, no Acre, considera irônico que
"justamente na gestão do presidente Lula e da ministra Marina Silva
tenham a aprovado a Lei de Gestão de Florestas Públicas, que nada mais
significa do que a privatização do solo e das florestas brasileiras" .

Desde a época dos "empates" - forma de resistência pacífica, iniciada
em 1976, em que grupos de 100 a 200 seringueiros conseguiam impedir a
derrubada das matas -Osmarino esteve, ao lado de Chico Mendes e
centenas de outros companheiros, na organização da luta dos Povos da
Floresta, denominação dada aos índios, seringueiros, castanheiros,
dentre outros habitantes da Floresta Amazônica, que se uniram para
defender a viabilidade econômica do modo de produção extrativista. O
movimento atingiu o auge no final da década de 1980, ganhando apoio
nacional e internacional, culminando com a morte de Chico Mendes, a
mando de fazendeiros interessados em transformar áreas de floresta em
pastagem.

Osmarino compara a morte de Chico Mendes a "um banho de água fria",
que desarticulou o movimento de resistência por vários anos. "O
confronto com outros interesses econômicos - madeireiros, pecuaristas
- resultou no assassinato de 372 companheiros, sendo 14 dirigentes
sindicais, além de padres, freiras, jornalistas que assumiram a nossa
causa" - lembra o seringueiro.

A realização do I Encontro Nacional dos Povos da Floresta, em 1989,
que tinha como um dos principais objetivos a criação de reservas
extrativistas, aconteceu um ano depois do assassinato de Chico Mendes.
Desde então, só em setembro do ano passado, 2007, foi organizado o II
Encontro, com a presença de antigos militantes do movimento, já então
como mandatários, como Lula e Marina da Silva.

Indignado, Osmarino não entende como a conquista de cargos de poder
por antigos correligionários trouxe tão poucos avanços para os Povos
da Floresta, enquanto o capitalismo predatório avança a passos largos:

" Lula e Marina, em vez de botar os predadores para correr, criaram o
Projeto de Gestão de Florestas Públicas! São13 milhões de hectares de
florestas que vão a leilão no próximo ano (3% da Amazônia). O projeto
permite a concessão de vastas áreas de florestas a empresários, por 40
anos. Quando o contrato terminar, ainda poderá ser renovado por mais
30 anos. O governo Lula está entregando a Amazônia por 70 anos!" -
desabafa Osmarino.
Os que defendem a aplicação da Lei de Gestão de Florestas Públicas,
aprovada em 2006, argumentam que, ao contrário, ela irá disciplinar a
atividade madeireira, coibir o desmatamento ilegal, gerar emprego,
renda, compatibilizando a preservação do meio ambiente com do uso
sustentável da floresta.

Os que divergem, como Osmarino, preocupam-se, sobretudo, com o fato do
estado brasileiro transferir para a iniciativa privada a
responsabilidade por uma pretensa exploração sustentada e conservação
das florestas, cada vez mais atingidas pelo desenfreado desmatamento
ilegal. Concedendo as florestas, a responsabilidade direta pelo
desmatamento poderia ser atribuída às concessionárias, o que de certa
forma diminuiria a responsabilidade oficial pelo desastre ambiental.

A privatização das florestas dá margem a grande apreensão. Este mês, a
|Justiça Federal suspendeu o processo de concessão da Floresta
Nacional de Jamari, em Rondônia, que seria a primeira a ser explorada
de acordo com a Lei de Gestão de Florestas Públicas. A desembargadora
do TRF, Selene de Almeida, alegou que, sendo a floresta uma área
pública, qualquer decisão deveria ser referendada pelo Congresso
Nacional. A área concedida seria de 220 mil hectares. Disputaram a
concessão 14 empresas, muitas delas madeireiras.

O presidente da Associação de Moradores e Produtores da Reserva Chico
Mendes teme a cooptação dos seringueiros por setores ligados ao
governo e que, na sua avaliação, cederam aos interesses dos grandes
grupos econômicos e oferecem aos Povos da Floresta falsas promessas:

"Esses setores se perderam. Estão preocupados com o lucro imediato e
não com as conseqüências a médio e a longo prazo da entrega das
florestas a grupos privados. Já estão plantando soja na Amazônia! Já
estão pensando em explorar petróleo no seio da floresta! O BNDES está
investindo R$ 10 bilhões na construção de barragens que vão matar 172
afluentes do Rio Madeira, destruir cachoeiras e sítios arqueológicos.
E pra quê? Pra vender energia barata para as multinacionais. Se
criassem cinco usinas para beneficiar a castanha, acabariam com o
desemprego no Acre, por um custo muito menor, ecológico, econômico e
social".

Segundo ele, os fazendeiros usam técnicas cada vez mais sofisticadas
para desmatar, despistando a fiscalização por satélite: "Desmatam a
floresta baixa, transformam em pastagem, e deixam a alta de pé. Depois
inventam um incêndio acidental, no verão, para acabar com a floresta
alta, e a pecuária já está lá".

Como resposta a essas agressões ambientais, o seringueiro diz que está
sendo preparado um empate internacional: "Estive em La Paz, reunido
com campesinos brasileiros, bolivianos, equatorianos, venezuelanos.
Se ganharmos o Sindicato da Brasiléia, a correlação de forças muda.
Estamos preparando um empate internacional. No próximo Fórum Social
Mundial, em Belém, em janeiro de 2009, estaremos participando com
muitas propostas. Vai ser uma homenagem aos 20 anos sem Chico Mendes"
- concluiu.

http://www.apn.org.br

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